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quarta-feira, 6 de maio de 2015

A ilha

Não saberia dizer o que fiz de minha vida. Esse ano completarei 26 anos. Fiz faculdade, trabalhei em dois lugares diferentes, tive minha parcela de amores e desamores, mesmo que muito breves. Mas me sinto fincado num buraco, incapaz de ir adiante. Odeio meu trabalho, odeio o pouco dinheiro que ele me paga, odeio querer fazer tantas coisas e não saber por onde começar. Queria tanto, mas tanto mudar a minha vida e começar a lutar para ser feliz, só que parece que desaprendi a fazer isso. Me vejo caindo cada vez mais rápido naquela vidinha adulta que eu sempre temia: um emprego meia-boca, que me rouba muitas horas por dia, para chegar em casa e não me sentir apto a fazer mais nada de produtivo. Cresci. Sou um adulto agora. Vivo como um adulto, pago contas como um adulto. Tenho dívidas crescentes como um adulto. Um adulto incompleto, perdido e bastante infeliz.

Talvez seria melhor se eu fosse uma pessoa que não ligasse pra isso, que não se desse ao trabalho de gerar esse tipo de raciocínio, porque aí aceitaria tudo que me acontece e pronto, poderia até ser feliz. Eu... sei, ou ao menos tento saber, da minha responsabilidade pela situação atual de minha vida. Querer ir adiante é diferente de agir pra ir adiante, e não ando agindo muito. Os dias passam, viram meses, que já viraram mais dois anos de pura insatisfação. Como eu não soube aproveitar bem a minha faculdade e grande parte das oportunidades que me apareceram, me vejo agora irremediavelmente perdido diante de um mundo que só quer saber de me devorar. E eu, que sempre fui aquela criança assustada, escondida no meu canto, com medo de ser colocada à prova algum dia... Me sinto plenamente despreparado para sequer abrir a minha boca e dizer "tenho um sonho para realizar".

Sinto tanta dor ao me sentar na cadeira do trabalho, tanta dor ao me forçar a sorrir e a servir essas pessoas a quem pouco consigo respeitar. O ódio cresce dentro de mim, parece que estou afundando dentro dele. Mas nada muda. Houve uma época em minha vida em que as decisões importantes foram tomadas pelo destino e eu apenas era carregado pela correnteza. Hoje essa correnteza me empurra em direção a uma queda mortal e só me resta me proteger em uma "ilha segura" ou nadar para chegar mais longe.

Parece que a vida adulta é exatamente isso: um rio de águas violentas e cruéis. E nossos empregos ou as formas que encontramos de nos sustentar são essas ilhas, espalhadas no caminho. Uns conseguem construir embarcações, através das experiências e de seus investimentos, e passam a desafiar as águas muito mais bravamente. Outros, como eu, desaprendem a nadar e ficam numa mesma ilha, deprimidos e sonhando com espaços maiores e melhores, onde poderiam ser felizes. Minha confiança, meu crescimento, minha aparente inteligência: de nada isso vale frente à correnteza. Porque não sei fazer valer, não sei viver essa vida e reluto muito em aprender.

Fico parado, engasgado, travado no tempo enquanto o resto do mundo gira em sua indiferença à minha dor. Queria chorar, mas não consigo. E os entretenimentos que encontro me servem de analgésicos, os quais me impedem de me tornar uma pessoa totalmente amarga e cruel.

Queria que minha vida mudasse... Queria que alguém pudesse fazer isso por mim. Queria achar uma fórmula mágica para isso. E queria não ter que passar por essas coisas. Mas queria, também, ser mais forte, para justamente passar por essas coisas e sair vitorioso. Queria mudar a minha vida eu mesmo, me sentir orgulhoso de minhas conquistas, de meus pertences, do que eu posso fazer. Queria... Estar satisfeito.

No escritório, o pequeno rádio ligado corta o silêncio com suas canções que nada me dizem. A mesma sinfonia de teclas e telefonemas faz sua performance, enquanto os funcionários realizam suas coreografias ao som dessa música bizarra.

E eu, com os olhos fechados, rezo para que mais um dia nessa ilha acabe logo.